
O cancelamento de súmulas e OJs pelo TST e seus reflexos na atuação da advocacia trabalhista
- Introdução
Em junho de 2025, o Tribunal Superior do Trabalho promoveu uma revisão profunda de sua jurisprudência consolidada, cancelando 36 súmulas e orientações jurisprudenciais (OJs) que, por anos, nortearam a atuação da advocacia trabalhista.
A medida, que visa alinhar os precedentes da Corte à Reforma Trabalhista de 2017 e às decisões vinculantes do Supremo Tribunal Federal, marca um novo capítulo na interpretação do Direito do Trabalho no Brasil. Diante desse cenário, impõe-se à advocacia o desafio de reavaliar práticas, contratos e teses processuais à luz da nova orientação institucional.
O presente artigo propõe uma breve análise crítica, sem qualquer finalidade exaustiva, dos impactos desse movimento na rotina da advocacia, destacando pontos de atenção indispensáveis na orientação de clientes e na condução das lides trabalhistas.
- A atuação do advogado trabalhista frente à revogação dos enunciados e novos Precedentes do TST
A revogação dos enunciados pelo TST não constitui mero ajuste técnico, mas sim um reposicionamento político-jurídico da Corte frente ao novo modelo trabalhista. Entre os enunciados cancelados estão súmulas clássicas como a 331 (sobre responsabilidade subsidiária da Administração Pública), e OJs que tratavam de temas como horas in itinere, prescrição intercorrente e adicional de periculosidade. Muitas dessas normas vinham sendo relativizadas na prática, mas ainda serviam como suporte argumentativo relevante na atuação contenciosa e consultiva.
Para o advogado trabalhista, a principal consequência prática dessa mudança está na necessidade de revisão de estratégias jurídicas consolidadas. A súmula ou OJ antes invocada como "trunfo" processual, hoje pode representar um risco de improcedência e até mesmo de sucumbência em honorários advocatícios, especialmente após o fortalecimento da litigância responsável trazido pela Reforma Trabalhista. Petições-padrão, modelos de defesa e até orientações contratuais devem ser revisados com urgência.
Além disso, o advogado deve estar atento à admissibilidade material das teses jurídicas que pretende sustentar, sob pena de mobilizar a estrutura judicial em torno de pretensões fadadas ao insucesso. Para Ada Pellegrini Grinover, embora o Estado tenha interesse no exercício da jurisdição, “não lhe convém acionar o aparato judiciário sem que dessa atividade se possa extrair algum resultado útil”. Tal reflexão ganha relevo diante da revogação de enunciados que anteriormente davam sustentação formal a pedidos agora desamparados pela jurisprudência superior. A advocacia trabalhista, nesse contexto, deve atuar como verdadeira filtradora da viabilidade processual, orientando com rigor técnico e senso de responsabilidade.
É evidente que essa preocupação não pode servir como obstáculo ilegítimo ao exercício do direito de ação, especialmente em matérias de cunho social, como é o caso do Direito do Trabalho. Trata-se, antes, de reforçar a responsabilidade técnica da advocacia na escolha das teses a serem levadas ao Judiciário. Já tive a oportunidade de tratar desse equilíbrio em outras ocasiões, como no artigo publicado pela LTr “A quitação plena e geral do contrato de trabalho e a inafastabilidade da jurisdição”, escrito em coautoria com o Professor Geovany Cardoso Jeveaux, e mais recentemente em minha dissertação de mestrado, depositada no repositório da Universidade Federal do Espírito Santo, na qual aprofundo a análise do acesso à justiça a partir da doutrina de Mauro Cappelletti e Bryant Garth.
Além disso, a atuação preventiva, voltada à assessoria jurídica empresarial, também deve ser impactada. A valorização da negociação coletiva e a eliminação de entendimentos que restringiam a autonomia das partes exigem maior cautela na elaboração de cláusulas contratuais e na interpretação de convenções e acordos. Cláusulas sobre jornada 12x36, intervalos, banco de horas e funções híbridas, por exemplo, agora podem ser enfrentadas com mais segurança jurídica, desde que observados os parâmetros legais e coletivos vigentes.
Outro ponto de destaque está na responsabilidade ética da advocacia na comunicação com seus clientes. A revogação de entendimentos deve ser informada com clareza e tempestividade, a fim de evitar expectativas irreais sobre direitos que não encontram mais respaldo nos tribunais superiores. Essa postura, além de necessária à boa-fé na relação cliente-advogado, também resguarda o profissional de eventuais alegações de má condução do processo.
- Conclusão
O cancelamento de súmulas e OJs pelo TST inaugura uma nova fase na jurisprudência trabalhista brasileira, com importantes reflexos na atuação prática da advocacia. Mais do que uma atualização normativa, esse movimento exige reflexão estratégica, revisão de métodos e atuação proativa na orientação de clientes.
O advogado trabalhista, diante desse novo cenário, deve reforçar seu compromisso com a atualização constante, com a advocacia responsável e com a construção de teses jurídicas coerentes com o atual entendimento dos tribunais superiores. O momento é de transição, mas também de oportunidade para fortalecer a credibilidade e a técnica da advocacia especializada.
- Referências
BRASIL. Tribunal Superior do Trabalho. Pleno do TST cancela 36 súmulas e orientações jurisprudenciais. Disponível em: https://www.tst.jus.br. Acesso em: jul. 2025.
CAVALCANTE, Rodrigo. TST revoga súmulas e OJs: o que muda com a nova fase da jurisprudência trabalhista. Migalhas, 01 jul. 2025. Disponível em: https://www.migalhas.com.br/quentes/433815/tst-revoga-sumulas-e-ojs-superadas-pela-reforma-trabalhista-e-pelo-stf.
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