Com a palavra o presidente da OAB-ES

A Moqueca e os Pecados Capitais



Dendê e leite de coco. Pior do que dizerem que temos sotaque, essas duas especiarias causam calafrios aos capixabas, especialmente ao imaginá-las no preparo da nossa moqueca, que é, por sinal, meu prato favorito. Melhor do que comer moqueca, só comê-la em boa companhia e discutindo as melhorias do nosso valoroso Sistema Judiciário. Essa era a proposta para a última segunda-feira.

Na semana passada, fui instado pela cerimonialista do Conselho Nacional de Justiça a receber diversas autoridades na sede da Ordem dos Advogados do Espírito Santo, palco de profundos debates de interesse da sociedade, mas ainda pouco vocacionada para almoços elaborados. No meio desse alvoroço para bem receber a comitiva de Brasília, contratamos, sob expensas pessoais, o restaurante mais tradicional, garçons, e convidamos conselheiros da OAB, presidentes de subseções e de comissões para o evento, mobilizando cerca de 80 pessoas. Foram feitas visitas ao restaurante, organizou-se absolutamente tudo para servir a famosa moqueca à autoridade e sua comitiva, inclusive o dono do estabelecimento fez uma visita in loco para averiguar a possibilidade de servir a famosa iguaria. Enfim, todos nós estávamos felizes e mobilizados pelo encontro.

Às vésperas do evento, recebi uma mensagem comunicando que o encontro estava cancelado, uma vez que a comitiva havia optado por almoçar em outro lugar, que, pelo que soube, também serviria moqueca… Tivemos o profundo desconforto de pedir desculpas a todas as pessoas envolvidas e que haviam se mobilizado de alguma forma para estar naquele evento ou haviam contribuído com sua realização.

Na sequência, nos foi sugerido um novo encontro para receber a comitiva do CNJ, no entanto, em horário coincidente com a solenidade de entrega de carteiras. Respeitosamente declinei, não do encontro, mas do horário sugerido, para prestigiar os jovens advogados e respeitar seus familiares que haviam se organizado previamente.

Em tempos estranhos como o que vivemos, foi-me atribuído, pelos aproveitadores de plantão, sempre eles, uma espécie de pecado capital, digno de Dante, por ter tido a ousadia de não cancelar minha participação em um evento em que já havia confirmado presença. Nos últimos dias, ouvi perguntas curiosas, do tipo: “Como eu não disponibilizei a totalidade da minha agenda às autoridades?” e “Como fiz questão de estar presente para advogados recém-ingressos aos quadros da OAB?”

Na última vez que li a Constituição Federal, não encontrei nenhum grau de hierarquia entre advogados e outras autoridades, mas talvez eu esteja desatualizado. O que causa estranheza e profunda reflexão não foi a crítica feita pela Autoridade, esta possivelmente não recebeu todas as informações de sua cerimonialista sobre o que realmente aconteceu, mas alguns colegas advogados que alardearam e alardeiam nas redes sociais uma subserviência cega da OAB.

Desculpe, esse papel eu não me presto na qualidade de presidente da Seccional do Espírito Santo.

José Carlos Rizk Filho é presidente da Ordem dos Advogados do Espírito Santo (OAB-ES)

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