Artigo: Uma prática dolorosa que nos traz lucidezPublicado em 30 de Março de 2017 • 16:06Artigo da Presidente da Comissão de Direitos Humanos da OAB-ES, Verônica Bezerra Há pouco mais de um ano à frente da CDH OAB-ES, muitos foram os encontros e desencontros que vivenciamos. Diversas foram as situações de urgência e emergência que fomos levados a enfrentar, na tentativa de garantir a preservação dos Direitos Humanos. Todos os lugares, precisamos ir. Diferente do que pensa a grande maioria, não vamos somente ao presídio. Ouvimos lamentos, denúncias, choros, gemidos. Mas também ouvimos risos e esperança. O fevereiro de 2017 que vivenciamos, e que, diga-se de passagem, não nos recuperamos, ainda, (se é que algum dia algumas pessoas recuperarão), deixou marcas indeléveis e tocou muitas pessoas. Duas delas foram: Lucas e Marina. Marina é Pedagoga, ingressante no mestrado em Educação da Universidade Federal do Espírito Santo. Lucas é Advogado Criminalista, militante em Direitos Humanos e Frade Dominicano. Eles me enviaram o poema abaixo que, com extrema sensibilidade e lucidez, traz para nós um viés do fevereiro de 2017, que alguns teimam em ignorar: a democratização da violência. A falta de policiamento ostensivo, toques de recolher, assassinatos, roubos, furtos, escolas sem aula, posto médico fechado e medo, era privativo dos bairros de periferia. Corrigindo, é privativo. Sim. A greve acabou, mas ainda hoje em nosso Estado, bairros ainda vivem essa realidade, mas não é notícia, mesmo que as pessoas sintam tudo o que a gente sentiu entre os dias 03 a 25 de fevereiro. Por isso, publicizamos o poema de Marina e Lucas, CANTO SANTO DE PAZ Marina de Oliveira Delmondes eFrei Lucas Francisco Neto, OP Estava a violência guardada no guetoAté que o guarda cansou de guardarE a violência qual golpe de ventoMudou-se pro CentroRespirou outro ar.O silêncio da paz agredidoOfendidoEm seu desespero começou a gritarO Espírito Santo que é ventoQue é brisaNa montanha ou no marNem mais o seu congo saiu pra dançar.O povo guerreiro lutou outra guerraA guerra do medo trancado em seu larMas homens valentes saíram com armasE a violência de volta pro guetoPro pobrePro pretoFizeram voltar.Agora podemos nos ver outra vezSem vozE nem vezDevemos gritarPela paz duradoura que nunca chegaráPelas armas do EstadoOnde o Estado não chegaOnde só chega a fome e o extermínioViver é lutarSeja com o silêncio da morte do meninoOu da vida da mulherQuando a ordem é ocultarO povo permaneceráCom medo do medo que pode voltarQuando nos encontrarmosNa Praia do CantoNos bares do CentroNo Santo ConventoOuNa mesa do Altar.Em São Pedro e seus morrosVila Velha e seus becosAdalberto e ladeirasUm só povo a clamarNuma só vozNa EucaristiaVida, Páscoa, Partilha,Morte e RessurreiçãoCelebrar é memóriaÉ fazer a históriaNunca desanimarÉ silêncio! É choro!É sorriso a brotar.É canto de PazNeste solo que é SantoPovo de todo cantoCanto novo a entoar!